Comunicar em tempos difíceis

Uma comunicação eficaz é o segredo de uma relação duradoura, e não existem relações duradouras sem conflito. Então imagino que estejam a pensar: isso é um paradoxo! Pois, é no mínimo confuso e levanta algumas questões, vejamos se conseguimos entender o que se passa com a forma como comunicamos.

Parece-me importante começarmos pela constatação de que nem toda a comunicação é verbal, nós comunicamos com o corpo, com expressões faciais, com as nossas ações, poderíamos até dizer que somos uma mensagem ambulante. A complexidade da nossa comunicação permite-nos misturar as modalidades verbal e não-verbal e criar mensagens sofisticadas onde o conteúdo e a forma se relacionam das mais variadas maneiras.

Todo o nosso comportamento é sujeito às mais variadas interpretações e todos esses sinais variam consoante aquilo que queremos transmitir aos outros, ou a nós próprios. Isto porque, se a qualidade da comunicação é importante para as nossas vidas, então tudo começa com a comunicação que temos com nós mesmos e com os significados que atribuímos aos comportamentos. Nem tudo o que parece é, às vezes a nossa perceção pode estar a ser afetada por fatores que nos compelem a tirar certezas de situações incertas, os também chamados “mal-entendidos”. Imaginemos esta situação de conflito entre a Maria e Manuel, exagerada, mas que nos pode parecer familiar:

Maria: Vamos às compras?

Manuel: Não podes tratar disso sozinha?

Maria: Tu nunca fazes nada do que eu te peço, és um inútil!

Manuel: E tu só serves para me chatear!

Já todos nós passámos por situações semelhantes, quando sentimos que o outro não nos teve em consideração, que não nos ouviu, que não esteve presente para nós, e fazemos tudo o que podemos na tentativa de fazer o outro perceber o quanto nos magoou. Nada nos afeta mais do que quando nos sentimos emocionalmente afastados daqueles a quem estamos mais ligados, e quando sentimos no outro um sinal deste afastamento reagimos de imediato com as nossas emoções em alta, deixamos de conseguir pensar racionalmente e perante o conflito só pensamos em duas coisas: 1) ataque/combate ou 2) defesa/fuga. O problema do combate é que resulta usualmente num escalar de violência cíclico que só termina com o fim da relação.  Mesmo que exista a vitória de um dos lados, o vencido fica sempre ferido com a perda, o que aumenta ainda mais a distância emocional entre os dois. Por sua vez, a fuga pode ser sentida como o retraimento afetivo, que ocorre quando uma das partes se retira do conflito escolhendo ignorar o outro, o que intensifica ainda mais a resposta violenta do último que continua exasperadamente a tentar estabelecer contacto com uma “parede” emocional. Concluindo, nenhuma destas estratégias parece ser eficaz na resolução do conflito, daí a questão, o que é que constitui uma comunicação eficaz? É aqui que entra a comunicação assertiva.

Comunicar eficazmente significa ouvir e ser ouvido, ter a capacidade de passar a mensagem de forma a que o outro se sinta compelido a ajudar-nos. Existem alguns princípios que nos podem guiar:

1) Substituir as críticas por observações objetivas – quanto mais objetivos formos em relação ao nosso pedido maior a probabilidade do outro interpretar a nossa queixa como uma tentativa legitima de comunicação e não como uma crítica;

2) Substituir o “tu” por “eu” – devo falar dos meus sentimentos, são meus e indiscutíveis, ao falar de mim não estou a atacar o outro, estou sim a permitir-me ser vulnerável na sua presença acedendo à emoção e à abertura que fará com que o outro queira cooperar comigo;

3) Acrescentar a necessidade partilhada que não foi satisfeita – mostrar ao outro que isto não importante apenas para mim, mas para nós e que a sua presença é valorizada.

Voltemos ao exemplo da Maria e do Manuel, como teria corrido a discussão se tivessem aplicado estes princípios?

Maria: Vamos às compras?

Manuel: Não podes tratar disso sozinha?

Maria: Eu sei que tu andas muito ocupado, mas quando eu te peço para vires comigo às compras e tu perguntas se não posso ir sozinha (1) eu sinto-me triste (2), é importante para mim sentir que tens tempo para fazermos coisas juntos, mesmo que sejam banais (3).

Manuel: Claro que sim e eu quero estar contigo, vamos lá então.

Voltando ao aparente paradoxo do início, aprender a comunicar eficazmente implica um investimento de ambas as partes, é difícil, mas o conflito é saudável – significa que queremos comunicar, que queremos estar presentes na vida do outro e que nós, enquanto relação, somos importantes.

Alexandre Horácio -Psicólogo Mental8Works

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