Murray Bowen na terapia da família

Bowen esteve entre os pioneiros da terapia familiar e um notável fundador da terapia sistêmica. Desenvolveu uma teoria de sistemas da família – assenta em duas perspetivas, aquelas que levam a pessoa à união com sua família e aquelas que a impulsionam para se libertar rumo à individuação.

O autor concebe a família com uma unidade emocional, em que todos os elementos estão ligado entre si e influenciam-se mutuamente, como um sistema. No seu trabalho encontramos vários conceitos, destacamos dois devido à notória influência nos sistemas familiares, a diferenciação do ego e a ansiedade.

Para Bowen, o objeto de estudo é a família nuclear, onde recorre à família de origem como ferramenta para ajudar a reduzir a tensão familiar, i.e., recorre ao histórico geracional dessa família nuclear. O objetivo da sua teoria é identificar a diferenciação do indivíduo em relação à família, e é essa capacidade de diferenciação que vai implicar na saúde mental do indivíduo. O estabelecimento do grau de diferenciação do ego inicia-se na relação primária estabelecida com os pai, da mesma forma que o nível de diferenciação de ego dos progenitores se estabelece através da relação destes com os seus próprios pais – numa noção de cadeia. Este conceito determina o quão longe  família pode progredir na aquisição de autonomia.

Na teoria boweniana, o triângulo é a unidade universal de análise em princípio e na prática. Como Freud, Bowen enfatiza importância crucial das relações familiares iniciais. O relacionamento entre o self e os pais é descrito como um triângulo e considerado o mais importante da vida. O entendimento de Bowen dos triângulos é uma de suas contribuições mais importantes e uma das ideias seminais na terapia familiar.

Para o autor, o maior problema nas famílias é a fusão emocional, que surge de uma necessidade de proximidade. Algumas pessoas manifestam a fusão diretamente, como uma necessidade de proximidade, outras a mascaram com uma fachada de pseudoindependência.

A pessoa com um ego diferenciado não precisa se isolar, mas pode permanecer em contato com os outros mantendo sua integridade. Da mesma forma, a família sadia é aquela que mantém um contato emocional de uma geração para outra.

Defende-se a necessidade de equilíbrio entre a proximidade e a independência, mas a prática tem um caráter distintamente intelectual. Bowen via a ansiedade como uma ameaça ao equilíbrio psíquico, e, consequentemente, a sua abordagem de tratamento muitas vezes parece desapaixonada. Ele afastava-se do calor das confusões familiares para contemplar a história dos relacionamentos da família. O modelo de Bowen tira o foco dos sintomas a favor da dinâmica sistémica. O tratamento desestimula o terapeuta a tentar resolver os relacionamentos e, ao invés, encorajar os clientes a começar um esforço vitalício de autodescoberta.

Na prática clínica é possível observar estes conceitos, tal poderá verificar-se no caso clínico que apresento de seguida.

Maria tem 36 ano, casa com José com 40, têm um filho António de 2 anos. Maria viveu na casa dos pais até aos 26 anos, altura que sai e vai estudar para longe da sua cidade. A relação com a sua mãe é muito próxima – chegam a falar várias vezes por dia ao telefone e trocam mensagens constantemente. Maria, procura constantemente a parecer da sua mãe, em tudo o que lhe acontece ao longo do dia. Por sua vez, a mãe está sempre em contato com a Maria para saber como ela está e como está a ser o seu dia – realçamos que há histórico clínico de depressão/internamentos na vida a Maria. Se por algum motivo, estes contatos não acontecessem, a mãe fica extremamente ansiosa e num pensamento espiral que só se tranquiliza quando chega à fala com a Maria – este ansiedade muitas vezes é também expressada pela Maria. .

A Maria liga com muita frequência à sua melhor amiga Rita, contando o seu dia, este comportamento fica mais realçado nos dias que Maria está mais ansiosa por algum motivo “banal” da faculdade, e.g. dia de exame. Aqui poderemos verificar a dificuldade que Maria tem em gerir os acontecimentos da sua vida e a ansiedade que eles provocam em si. Podemos afirmar que aqui está retratado um grau de indiferenciação e ansiedade que possivelmente é transmídia transgeracionalmente.

O autor ao longo do seu trabalho também nos fala de outro conceito importante, a distância emocional – aparece como um dos padrões da ansiedade nas relações conjugais, que são o reflexo de ligações emocionais não-resolvidas. Nestes casos específicos, à medida que a ansiedade aumenta os contatos conjugais diminuem significativamente. Em modo de ilustração, um casal com formas de estar e de pensar diferentes, levando a discussões constantes, originando um distanciamento grande na gestão das questões conjugais, levando a tomadas de decisão unilateral sem qualquer consulta da opinião do parceiro.  Este tipo de comportamento, originará por sua vez um distanciamento emocional ainda maior.

A teoria boweniana enfatiza que, para compreender a família, é necessário desvelar o que acontece nas gerações que a precederam e ampliar o olhar para a família extensa. Cada indivíduo, é parte de uma rede de relações que envolvem as respectivas famílias de origem, e é através de interações que permitem a cada pessoa experimentar o que é e o que não é admissível na relação, criando a base de uma unidade sistémica. Para o autor, o ténico é mais que um teraeuta familiar, é que gere o ego – apoiando de forma a ativar e a reforçar os “processos de autoregeneração” referentes a cada família.

Como profissional reconheço a importância e relevância desta teoria no sistema familiar e de casal. Creio que compreender o limite da teoria de diferenciação do self passa pela compreensão da forma como as famílias estão estruturadas nos dias atuais.

Joana Nina -Psicóloga Mental8Works

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